The Project Gutenberg EBook of S� de Miranda, by 
Antero Tarqu�nio de Quental and Camilo Ferreira Botelho Castelo Branco and Joaquim de Araujo

This eBook is for the use of anyone anywhere at no cost and with
almost no restrictions whatsoever.  You may copy it, give it away or
re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included
with this eBook or online at www.gutenberg.org


Title: S� de Miranda
       Com uma carta �cerca da

Author: Antero Tarqu�nio de Quental
        Camilo Ferreira Botelho Castelo Branco
        Joaquim de Araujo

Release Date: June 19, 2008 [EBook #25845]

Language: Portuguese

Character set encoding: ISO-8859-1

*** START OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK S� DE MIRANDA ***




Produced by Pedro Saborano (produced from scanned images
of public domain material from Google Book Search)






Anthero de Quental & C. Castello Branco


S� de Miranda


Com uma carta �cerca da "Bibliographia Camilliana" de Henrique Marques

por

Joaquim de Araujo



LISBOA
Typ. da Companhia Nacional Editora
LARGO DO CONDE BAR�O, 50
1894




S� de Miranda





Anthero de Quental & C. Castello Branco


S� de Miranda


Com uma carta �cerca da "Bibliographia Camilliana" de Henrique Marques

por

Joaquim de Araujo



LISBOA
Typ. da Companhia Nacional Editora
LARGO DO CONDE BAR�O, 50
1894




POESIAS
DE
S� DE MIRANDA

Edi��o feita sobre cinco manuscritos ineditos e todas as edi��es impressas,
acompanhada de um estudo sobre o Poeta, variantes, notas, glossario, e um
retrato, por Carolina Micha�lis de Vasconcellos; Halle, Max Niemeyer, 1885.


� esta a primeira edi��o critica das Poesias de Francisco de S� Miranda,
o Horacio e o Seneca portuguez, como lhe chamaram os contemporaneos, o
reformador do Parnaso portuguez no seculo XVI.

Foi necessario que se passassem mais de 300 annos (Miranda morreu em
1558: a primeira impress�o de parte das suas obras tem a data de 1595)
para que apparecesse uma edi��o critica, indispensavel todavia desde o
primeiro dia. E ainda assim n�o a devemos a nenhum dos nossos--como a
nenhum dos nossos devemos a admiravel edi��o do Cancioneiro de Garcia de
Resende (de Stuttgard), a edi��o diplomatica do Cancioneiro do Vaticano
(publicada em Halle pelo italiano Monaci) e tantos outros valiosissimos
trabalhos sobre a nossa lingua e literatura, publicados, no decurso dos
ultimos 50 annos, em Allemanha, Holanda e Fran�a. Uma senhora alleman,
hoje portugueza pelo casamento, pessoa t�o modesta como intelligente e
laboriosa, e a quem a historia da lingua e literatura portuguezas tinha
j� a agradecer trabalhos, que, por passarem desapercebidos nesta
verdadeira Caverna do Esquecimento, que � o Portugal de hoje, nem por
isso deixam de ser de primeira ordem, emprehendeu e levou a cabo a
restaura��o do texto do grande poeta moralista do seculo XVI, que at�
agora andava, mais do que o de nenhum outro dos seus contemporaneos,
incerto, obscuro e deturpado. O trabalho corresponde plenamente ao muito
que havia a esperar do saber e penetra��o da autora daquella notavel
s�rie de Estudos camonianos, que come�aram a lan�ar alguma luz sobre o
estado cahotico do texto do nosso grande lirico.

Dez annos de aturado trabalho; estudo comparativo escrupolosissimo das
edi��es impressas e dos manuscritos ineditos; conhecimento profundo e
quasi topographico da epocha, dos costumes, dos personagens, da lingua,
das tendencias intellectuaes, uma extraordinaria familiaridade com todas
as _fontes_ do grande seculo; um grande e seguro sentimento da realidade
historica; criterio penetrante e elevado, ainda no meio das minudencias
a que tem de descer--eis o que representa esta edi��o critica, que n�o
encarecerei chamando-lhe um modelo.

N�o sei se entre os _romanistas_ da Allemanha (penso sobretudo no sabio
Storck) haver� algum que tivesse podido desempenhar-se do encargo, como
se desempenhou a sr.� D. Carolina Micha�lis: mas creio que afoutamente
se p�de affirmar que em Portugal, com excep��o desta senhora, ninguem
mais o poderia fazer, com igual exito. N�o � este um facto bem singular?

Hoje, s�o os estrangeiros que estudam e estimam a nossa antiga
literatura: n�s n�o. A crescente e hoje quasi total desnacionalisa��o do
espirito publico � o facto mais consideravel da nossa psychologia
collectiva, nos ultimos 50 annos. Os da actual gera��o, pode dizer-se
que, pelo pensar, pelo sentir, deixaram j� de ser portuguezes. Ha por
ahi muito rapaz intelligente e, a seu modo, instruido, que conhece mais
ou menos Moli�re, Racine, Voltaire e at� Rabelais e Ronsard, e que nunca
leu um auto de Gil Vicente, uma can��o de Cam�es, uma eglogla de
Bernardim Ribeiro ou de Bernardes, uma carta de Ferreira ou de S� de
Miranda.

Os que conhecem um pouco intimamente a historia das revolu��es
portuguezas neste seculo (n�o fallo s� das politicas) e t�em reflectido
sobre ella, achar�o facilmente a explica��o deste facto e, mais do que a
explica��o, a necessidade delle. Mas nem por isso deixa de ser cousa
triste de considerar este abysmo de esquecimento, que se abre cada vez
mais largo, entre o pallido, anemico e inexpressivo Portugal de hoje e
aquelle seu grande ascendente, o heroico, o pittoresco e inspirado
seculo XVI. A falta de sentimento nacional poderia, at� certo ponto (no
que diz respeito ao estudo da nossa antiga literatura) ser supprimida
pelo sentimento historico, pela curiosidade critica e _philologica_,
como dizem os allem�es: mas a decadencia dos estudos historicos tem
vindo acompanhando _pari passu_ a decadencia do sentimento nacional sem
que um ponto de vista mais largo, puramente scientifico, viesse, como em
Fran�a, por exemplo, substituil-o efficazmente, para compensar aquella
falta, pelo menos na esphera da intelligencia e do gosto.

Esse sentimento _philologico_ (geral, humano, critico, n�o restricto e
nacional) � o que caracterisa, entre todas as na��es cultas, o espirito
allem�o. Na sua imparcial sympathia, t�o vasta como a natureza humana,
abra�a ao mesmo tempo a antiguidade e os tempos modernos, as edades
classicas e os periodos barbaros, o Oriente e o Occidente, todas as
ra�as e todas as culturas. Essa sympathia exige uma s� condi��o: a
originalidade. Tudo quanto foi realmente vivo, quanto manifestou uma
maneira _sui generis_ de ser e de sentir, tudo quanto revelou uma face
distincta da complexa natureza humana, tem direito � sua atten��o. E �
por isso que a erudi��o alleman se distingue por uma fei��o unica: � uma
erudi��o viva. Houve erudi��o e eruditos: a curiosidade pelas cousas
passadas � uma das func��es da intelligencia. Mas uma erudi��o que sente
ao mesmo tempo que indaga, que critica e juntamente sympathisa,
minuciosa e enthusiasta, indagadora e poetica; uma erudi��o que revolve
montanhas de textos, datas, documentos, para descobrir, n�o factos
seccos e mortos, mas a alma e a vida das cousas extinctas; uma erudi��o,
se assim se p�de dizer, inspirada, tal como nos apparece nesses heroes
da philologia, os Boeckh, Welcker, Hermann, F. A. Wolf, Winckelmann,
Grimm, Niebuhr, Creuzer, Otfried Muller, Ritschl e tantos outros; uma
tal erudi��o era cousa desusada, e sem precedentes. Ella transformou a
comprehens�o da historia, fazendo circular uma vida nova atravez dessas
cryptas dos seculos sepultos, onde a candeia fumosa da velha erudi��o
academica apenas espalha uma claridade phantastica, quasi t�o morta como
as cinzas que ali repousam.

E ahi est� porque vemos uma senhora alleman publicar estudos magistraes
sobre o texto de Cam�es, publicar uma edi��o critica das Poesias de S�
de Miranda, preparando-se assim, durante annos, com toda a casta de
subsidios linguisticos, historicos e archeologicos, para nos dar (ou
antes, para dar � Allemanha) uma historia da literatura portugueza.
Outros lhe dar�o a historia da literatura indiana, ou da chineza, da
grega, da hebraica, da poesia dos Trovadores, das epopeias da Edade
Media, que sei eu? pois n�o ha um canto do vasto mundo da historia, que
escape � curiosidade ardente e penetrante da erudi��o alleman. A sr.� D.
Carolina Micha�lis internou-se pelo reino semi-classico do Romanismo e
ahi conquistou para si uma provincia, bem mais famosa do que conhecida,
ainda dos mesmos nacionaes: a lingua e literatura portuguezas.

Mas, dir�o muitos, que necessidade havia de uma edi��o critica de S� de
Miranda? pois n�o ha por ahi tantas edi��es dos poetas Quinhentistas,
desses famosos _classicos_, que pouquissimos l�em, � certo, mas que
ninguem que se preze deve deixar de citar com venera��o, e at� p�de
romper no excesso de ter na sua bibliotheca?

Estes ignoram (nem admira) que esses veneraveis _classicos_ s�o, at�
certo ponto, um mytho. Excepto o de Ferreira, nada ha mais duvidoso do
que o texto desses desgra�ados poetas. Das suas obras, a maior parte s�
se imprimiram depois da morte dos autores, nalguns casos vinte, trinta,
ou mais annos depois. Imprimiram-se sobre copias manuscritas e
geralmente copias de copias, e os editores n�o se esqueceram de juntar
aos erros dos copistas, ou suppostos erros, as suas proprias _emendas_.
A mesma paternidade das obras � em muitos casos duvidosa. Dos sonetos
attribuidos a Cam�es pelo seu mais recente editor, o sr. T. Braga, boa
ter�a parte n�o lhe pertencem ou s�o duvidosos. Tres eglogas de
Bernardes s�o dadas geralmente como de Cam�es. Ha autos de Gil Vicente
que pertencem muito provavelmente a outros autores. Poderiam
multiplicar-se estes exemplos. Em geral, os poetas de maior nomeada
absorveram pouco a pouco as composi��es dos menos famosos. E ainda se
fosse s� isso! Mas o proprio texto de cada uma das composi��es n�o
offerece, em geral, a authenticidade sufficiente: a linguagem foi
retocada pelos copistas ou editores; muitos versos foram substituidos.
Junte-se a isto a variedade de li��es, de edi��o para edi��o, de
manuscrito para manuscrito (dos que ainda existem, e s�o bastantes) e
comprehender-se-ha o que quiz dizer com a palavra _mytho_. Quiz dizer
que quando cuidamos l�r Cam�es, por exemplo, podemos muito bem estar
lendo Bernardes, ou Caminha, ou Bernardim Ribeiro, ou _vice versa_
podemos tambem estar lendo alguns daquelles _minores_, que foram
absorvidos na aureola dos cinco ou seis astros de primeira grandeza--ou
podemos simplesmente estar admirando o parto engenhoso do editor do
seculo XVII.

Os antigos editores portuguezes nunca primaram por criticos: se ainda �
t�o raro encontrar um que o seja! O editor portuguez era, antes de tudo
um _devoto_: elle sahia � estacada, n�o para apurar um texto, o texto
preciso, com as suas lacunas, defeitos ou erros, se os tinha, mas para
levantar o _seu poeta_ acima de todos os outros, attribuindo-lhe o maior
numero possivel de composi��es e com a forma mais perfeita possivel. Se
encontrava um papel velho, no canto de alguma bibliotheca devia ser do
_seu poeta_: publicava-o. Se os versos eram maus, � porque a copia
estava errada: emendava-os. E � assim que, de edi��o para edi��o, foi
crescendo o numero de composi��es duvidosas, crescendo o numero de
interpeta��es e emendas, com que o texto cada vez mais se ia depurando.

Dos poetas do seculo XVI, os dois mais maltrados pela _devo��o_
impertinente dos editores s�o sem duvida S� de Miranda e Cam�es. Para
este ultimo n�o sabemos quando chegar� o dia da justi�a (da justi�a
philologica, entenda-se) mas deve estar longe, a avaliar pela maneira
porque os seus dois mais recentes editores, ali�s benemeritos pelo
trabalho e grande amor ao poeta, os srs. Visconde de Juromenha e
Theophilo Braga, se houveram nas suas edi��es, que, em pontos de
critica, correm parelhas com as dos mais _devotos_ editores do seculo
XVII. Talvez nunca chegue, a n�o ser que se metta nisso algum allem�o.
S� de Miranda, ao menos, p�de l�r-se com seguran�a no texto critico,
admiravelmente discutido e apurado, da edi��o de Halle.

Sou pouco erudito, nem estou escrevendo um artigo para alguma Revista
philologica, mas uma simples noticia para um jornal diario: por estas
duas raz�es, n�o me posso alargar pela analyse do trabalho da sr.� D.
Carolina Micha�lis, entrando pela parte technica delle. Quero s�
observar ainda uma cousa: � que este volume de mais de 1000 paginas, e
carregado de notas, � um livro interessantissimo. Porque? pelo que acima
disse do caracter da philologia alleman. O sentimento historico anima
toda aquella erudi��o; a comprehens�o da epocha d� relevo e interesse �s
indaga��es apparentemente aridas de datas, genealogias, etc. A cada
passo encontramos uma circumstancia, um facto biographico, pormenores de
costumes, que abrem repentinamente uma nesga do horisonte sobre aquella
vida extincta e a fazem resurgir para a nossa imagina��o. Quanto saber,
mas saber intelligente, saber que diz e ensina, enterrado modestamente
naquellas notas, que occupam as ultimas 200 paginas do volume! Essas
notas, juntas com a magistral Introduc��o, constituem uma verdadeira
monographia de S� de Miranda. Com aquelles elementos poderia a auctora
ter feito propriamente um livro de _literatura_, que se contaria entre
os melhores e seria lido, citado e festejado. Preferiu a essas vaidades
o cumprimento quasi religioso de um encargo, ha tres seculos por
cumprir, fazendo ao velho Poeta o maior servi�o que elle imploraria, se
podesse erguer a voz do seu tumulo: a restaura��o do texto das obras. _O
bom S�_ (como lhe chamavam no seculo XVI e depois) encontrou afinal um
nobre espirito, que piedosamente e quasi filialmente escutou aquelle
queixume de uma pobre larva e consagrou dez annos da sua vida para a
satisfazer. O _bom S�_ deve agora dormir descan�ado no seu tumulo.

Bom S�! Diz o velho biographo que, nos seus ultimos tempos, "com a magoa
do que lhe revelava o espirito dos infortunios da sua terra se affligia
tanto, que muitas vezes se suspendia e derramava lagrymas sem o sentir."
Tenho scismado muitas vezes nestas lagrymas do poeta humanista da
Renascen�a. E, n�o sei como, a minha imagina��o approxima-as logo da
tragica melancholia de Miguel Angelo, da nobre tristeza de Vittoria
Collona, da misanthropia incuravel de Machiavel, da nuvem de desgosto e
desalento que envolveu a velhice de quasi todos os grandes espiritos da
Renascen�a. Tinha motivo de chorar o nosso S� de Miranda, como tinham
motivo de se entristecerem os seus illustres congeneres. � que elles
presentiam todos, uma cousa sinistra: o abortamento da Renascen�a.
�quella immensa aurora succedia, quasi sem transi��o, o crepusculo
nocturno: e elles, os videntes, devisavam naquelle crepusculo
inquietador os movimentos de formas estranhas e sombrias, como de
monstros desconhecidos, e ouviam passar vozes mais assustadoras ainda,
vozes que cresciam formidaveis de todos os pontos do horisonte, sem se
ver quem as soltava.

Ahi por 1550, o abortamento da Renascen�a era j� visivel aos olhos dos
que ainda restavam daquellas duas incomparaveis gera��es dos promotores
della. O Concilio de Trento entrara j� na sua 6.� sess�o e era agora
irremediavel a scis�o do mundo latino com a Reforma germanica. Come�avam
as guerras da religi�o, que iam durar, numa furia crescente, perto de
cem annos, destruindo na��es inteiras. Os Jesuitas abriam os seus
Collegios, onde o espirito da Renascen�a, sophismado, amesquinhado,
pervertido, servia de capa � reac��o. Por toda a Peninsula, fumavam e
crepitavam as fogueiras da Inquisi��o. O Humanismo alado transformava-se
em erudi��o plumbea, inerte. A Arte cahia da crea��o no amaneiramento.
Um furor indiscriptivel, furor de disputas, furor de matan�as,
apossava-se da Europa e o pensamento livre, os sentimentos largos e
humanos, a alta cultura pareciam prestes a desapparecer da face da terra.

Tudo isto viam ou previam aquelles grandes espiritos. Tinham sonhado
salvar o mundo pela raz�o, e a raz�o parecera impotente, e o mundo
desesperado appellava definitivamente para a sem-raz�o. Dahi aquellas
incuraveis melancholias de uns, aquella desdenhosa misanthropia de
outros; dahi as lagrymas do nosso S�. Este antevia ainda outra cousa: a
morte da patria. Aquelle ouro do Oriente parecia-lhe j� (como depois se
viu bem que era) um caustico sobre o corpo da na��o, que lhe queimava,
que lhe roia as carnes, at� a deixar secca de todo, um esqueleto. Tinha
motivo sobejo de chorar, o pobre poeta!

Sim, lembram-me muitas vezes aquellas lagrymas. Descubro mais de uma
analogia entre aquella idade e a nossa. A raz�o n�o morreu, afinal.
Soterrada, respirando apenas, resurgiu todavia. S�mente mudou de trajo e
de nome: j� n�o � Humanismo, como no seculo XVI: chama-se agora
Philosophia, mas � sempre a mesma, � sempre a ras�o. E n�s tambem,
filhos da Philosophia, sonhamos salvar o mundo pela ras�o, dar-lhe ordem
e paz com as leis eternas por ella reveladas. Mas o mundo parece
novamente atacado de vertigem, parece appellar mais uma vez para a
sem-ras�o, para os instinctos bestiaes e para uma supersti��o mais
monstruosa ainda do que as passadas: a supersti��o da for�a. A
democracia � maneira que triumpha, perverte-se, parecendo preparar-se
para marcar um despotismo sem nome, o despotismo anonymo da multid�o, o
achatamento universal.

Lembram-me as lagrymas de S� de Miranda. Se teremos tambem de as chorar
na nossa velhice? Esperemos que n�o, ou digamol-o, pelo menos, para n�o
desanimar ninguem--para n�o desanimarmos tambem n�s.

Junho de 1886.

                                                        ANTHERO DE QUENTAL.




UMA SATYRA DE S� DE MIRANDA

Alguns jornaes provincianos, quando o sr. visconde de Lindoso, ha dois
mezes, foi promovido a conde, disseram que na gera��o de s. exc.� havia
dezenove alcaides-m�res de Lindoso, a contar desde o reinado de D.
Diniz. Se ha erro na contagem, n�o serei eu que o corrija. O leitor n�o
hade, desta vez, exultar com a certeza de que o sr. conde de Lindoso tem
dezenove alcaides na sua arvore genealogica.

O meu proposito � averiguar se algum d�sses dezenove praticou fa�anha
que o immortalisasse na chronica ou na epop�a.

Effectivamente, deparou-se-me um, cujo nome est� identificado a uma
poesia de Francisco de S� de Miranda. Dos outros, por emquanto, apenas
sei os nomes e as tradi��es provaveis dumas existencias obscuramente e
honradamente pacatas em Guimar�es, no transcurso de quatro seculos.

A celebridade que S� de Miranda, commendador das Duas Egrejas, deu ao
alcaide seu contemporaneo e visinho, n�o � nada �pica.

Chamava-se o alcaide-m�r de Lindoso, Christov�o do Valle, e residia no
seu castello. S� de Miranda morava na sua casa commendataria da Tapada,
n�o longe de Lindoso. Tinha o poeta um criado gallego que o alcaide,
especie de administrador de concelho e commissario de policia do seculo
XVI, prendeu por motivos insignificantes. S� de Miranda, escrevendo em
_Redondilhas_ a seu cunhado Manuel Machado, Senhor d'Entre-Homem e
Cavado, conta-lhe a pris�o do gallego, lardeando a noticia de axiomas
sentenciosos que muito lhe abonam a antonomasia de Seneca portuguez.
Principia assim:

    Inda que eu ria, e me cale,
    Que me eu fa�a surdo e cego,
    Bem vejo eu por que o do Vale
    Correu tanto ao meu galego.

Em quanto o do Valle lhe corre o gallego, diz elle que uns

    Ladr�es de seiscentas c�res
    Andam por aqui seguros,
    N�o lhe sahem taes corredores.

E a causa dessa impunidade � que o alcaide n�o fazia caso dos
malfeitores que lhe amea�assem o physico:

    Ap�s quem torna a si
    E primeiro mata ou morre
    N�o corre o do Vale assi,
    Que ap�s um tolo assim corre.

E vae nomeando uns patifes que andavam a salvo, um Basti�o, um Ribeiro,
personagens que se faziam respeitar pela valentia ou pelo dinheiro.

Depois de muitas maximas de san moral, o poeta volta-se para o governo e
exclama:

    Executores da lei,
    Havei vergonha algum dia!
    Este chama: Aqui dei rei!
    Este outro chama a valia.

Ora o fecho da satyra, que � o mais pungente della, est� deturpado na
composi��o negligente das impress�es que conhe�o, d�ste feitio:

    Outro chama: Portugal!
    De varas n�o ha e mingua.
    Desata a bolsa, que val.
    Traze sempre alada a lingua.

Com esta construc��o, assim aleijada, a satyra penetrante fica de todo
deslusida e estragada. Para que os equivocos flagelladores resaltem do
jogo das palavras de accep��o dupla, a reconstruc��o deve ser esta:

    Outro diz: em Portugal[1]
    De varas n�o ha hi mingua;
    Desata a bolsa, que Val
    Traz sempre atada a lingua.

      [1]Neste verso adoptei uma variante que se encontra na ultima
      edi��o das poesias de S� de Miranda.

� claro o intuito mordaz do poeta. Manda _desatar a bolsa_. Procede uns
bons cincoenta annos o _Put money in thy purse_ de Shakespeare. O poeta
inglez, pela b�cca perversa do _honest Iago_, mandava encher a bolsa; o
portuguez manda desatal-a depois de cheia; � a mesma ideia. _Desata a
bolsa_, diz elle, porque o Valle, o alcaide de Lindoso, quando o
amorda�am com dinheiro,

    Traz sempre atada a lingua.

O verso � m�u; mas S� de Miranda visava principalmente a fazer boa
philosophia, e contentava-se em alinhavar versos conceituosos em prosa
chan; por isso mofava delle o Camacho, na _Jornada do Parnaso_,
taxando-o de

    Poeta at� o umbigo, e os baixos prosa.

Seja como f�r, dos dezenove alcaides de Lindoso nenhum outro se gaba de
ter o seu nome registado na obra do grande mestre da Renascen�a lyrica
da Peninsula.

      *      *      *      *      *

N�o sei se � notorio em Portugal e nomeadamente no Chiado e Clerigos que
uma senhora, nascida e educada na Allemanha, e residente n�o ha muitos
annos no Porto, publicou em 1885 uma edi��o das _Poesias de Francisco de
S� de Miranda_, impressa em Halle. � um volume em 8.� fr. de 1085 pag.;
a saber CXXXVI que comprehendem a biographia do poeta, a topographia de
Carrazedo de Bouro, da quinta da Tapada, do solar de Crasto, e a noticia
particularisada dos codices manuscritos e das edi��es impressas que a
illustre escritora manuseou. As 946 paginas restantes comprehendem as
poesias conhecidas e as ineditas colhidas de varios manuscritos,
repartidas em quatro sec��es; e na sec��o ou _parte 5.�_ encontram-se
todos os poemas dedicados a S� de Miranda. Na margem inferior de cada
pagina inscreve a sr.� D. Carolina Micha�lis de Vasconcellos as
variantes dos codices conferidos, e nas _Notas_, que come�am a pag. 739,
entra s. ex.� na parte critica do seu valioso trabalho, desenvolvendo
raros e copiosos conhecimentos da literatura portugueza dos seculos XV e
XVI, e da vida intima dos seus poetas.

Referindo-se � satyra de S� de Miranda, cujos fragmentos trasladei,
escreve a illustrada senhora a pag. 754: _As allus�es a um_ da Vale...
_j� n�o podem ser decifradas_. Seria assombroso que s. ex.� conseguisse
exhumar da poeira dos cartapacios genealogicos de Guimar�es aquelle
Christov�o do Valle, alcaide infesto ao servi�al do poeta. Quantas
gera��es de leitores da carta do commendador das Duas Egrejas ter�o
passado inconscientes por sobre aquellas allus�es!

Nas notas, por�m, da sr.� D. Carolina de Vasconcellos ha lances de
investiga��o historica t�o penetrantes e intuitivos que d�o muito a
esperar, se os seus estudos nos baldios ingratos da archeologia
literaria n�o desanimarem arrefecidos pelo desaffecto que os portuguezes
manifestam pelo archaismo.

Aqui se me offerece um exemplo de lucida explora��o investigadora no
livro admiravel desta senhora. Na _Carta V_ de S� de Miranda a _Antonio
Pereira_ (pag. 237), o poeta, referindo-se ao solar dos Pereiras, escreve:

    Do qual ir�o ha muitos annos
    Um que aqui Braga regeu,
    Pondo aparte os longos panos,
    O passo dos castelhanos
    � espada o defendeu.

Commentando estes versos, explana a sr.� D. Carolina de Vasconcellos
(pag. 806): _Julgamos que se trata do av� do grande condestavel, i. �
de D. Gon�alo Pereira que regeu Braga como arcebispo no meado do seculo
XIV. Quando o infante D. Pedro invadiu em 1354 as provincias de Entre
Douro e Minho e Traz-os-Montes acompanhado de seus cunhados D. Ruy de
Castro e D. Jo�o de Castro foi ao seu encontro o arcebispo de Braga, que
o havia advertido em tempo dos sinistros projectos de D. Affonso IV. O
prelado apresentou-se como medianeiro para acalmar a contenda, e desviou
o colerico infante do Porto..._

Esta exposi��o tem equivoca��es. S. ex.� como logo veremos, corrige
alguns enganos com muita boa critica historica; outros, por�m, que n�o
emenda, pedirei licen�a para os apontar. O infante D. Pedro n�o invadiu
a provincia de Entre Douro e Minho em 1354. Ignez de Castro foi
assassinada em 7 de janeiro de 1355. A rebelli�o do filho contra o pae
come�ou nesta ultima data e terminou em 6 de agosto do mesmo anno, pelas
pazes feitas em Canavezes. Quanto aos irm�os de Ignez: ella n�o teve
algum que se chamasse _Jo�o_ ou _Ruy_. Teve dous: um, seu irm�o inteiro,
chamou-se D. Alvaro Pires de Castro, que foi conde de Arrayolos e
condestavel; o outro, seu meio irm�o, chamou-se D. Fernando Rodrigues de
Castro. Al�m destes irm�os, teve uma meia irman, D. Joanna de Castro,
que, depois de viuva de D. Diogo, senhor de Biscaia, casou com D. Pedro,
_o Cruel_, rei de Castella, depois da morte de Maria Padilha.

Quanto ao arcebispo D. Gon�alo Pereira, considerado por todos os
escritores nacionaes e estranhos que ha mais de dois seculos tratam a
historia portugueza no seculo XIV, pacificador na guerra civil
consecutiva � morte de Ignez de Castro, emenda a sr.� D. Carolina de
Vasconcellos (pag. 882): _O arcebispo de Braga, D. Gon�alo Pereira, jaz
sepultado numa capella annexa � S� de Braga, onde na inscrip��o tumular
se l� ter elle morrido no anno de 1348. �, pois, impossivel que a lenda
sobre a sua interven��o nas luctas de D. Pedro, o Justiceiro, e de
Affonso IV (1354) seja veridica._

Conjectura depois a reflexiva escritora se o poeta alludiria �
interven��o do arcebispo nas pazes entre o infante D. Affonso IV e seu
pae D. Diniz, ou � concordia que o mesmo prelado restabeleceu entre
Affonso XI de Castella e Affonso IV de Portugal.

Estas hypotheses suggeriu-lh'as o _Nobiliario do Conde D. Pedro_,
editado por A. Herculano, pag. 285. N�o p�de, todavia, prevalecer alguma
dessas conjecturas da excellente commentarista; porquanto S� de Miranda,
nas suas trovas, n�o trata de pazes; � de guerra, e � ponta da espada
com castelhanos:

    Um que aqui Braga regeu
    Pondo aparte os longos panos
    O passo dos castelhanos
    � espada o defendeu.

Daqui a pouco, espero conseguir que s. ex.� acceite o facto historico,
desembara�ada de hypotheses, como elle se acha escrito nos antigos
livros portuguezes.

Quanto � morte de D. Gon�alo Pereira emendou s. ex.� um descuido
repetido por todos os historiadores desde Manuel de Faria e Sousa e D.
Rodrigo da Cunha, que tambem faz D. Gon�alo contemporaneo de D. Pedro I,
j� reinante.

A data da morte do arcebispo em 1348 n�o era extranha para mim, quando
em 1874 escrevi: "Em 1347 foi D. Gon�alo visitar a provincia
transmontana. Chegando a Villa Flor com grande sequito, travaram-se alli
os seus criados com os moradores da terra, e de ambas as partes
belligerantes morreram quatro homens e sahiram doze mal-feridos.
Tangeram os sinos a rebate. Levantou-se a povoa��o armada. Cercaram a
residencia do arcebispo, mataram-lhe seis homens, e matariam o proprio
prelado, se n�o fugisse, pendurando-se de uma corda, que lhe n�o evitou
cahir de costas no terreiro e contundir-se gravemente. N�o contentes os
de Villa Flor com a fuga do seu arcebispo, tomaram-lhe as malas, de
envolta com parte dos capell�es e seis criados. Protegido por atalhos, o
contuso prelado chegou a Carrazeda de Anci�es, povoa��o importante
naquelle tempo, fortificou-se no castello, fez lavrar instrumento
publico, e enviou-o a D. Affonso IV. O rei, poucos dias depois, mandou a
Villa Flor uma al�ada com dois algozes bem escoltados, e fez enforcar os
sacrilegos que poude colher na devassa. Esta vingan�a nem por isso
alliviou os incommodos do arcebispo descadeirado na qu�da. Transferido a
Braga, deitou-se para nunca mais se erguer. Quatro mezes depois
adormeceu no Senhor." (_Noites de insomnia_, n.� 5, pag. 91 e 92).

Neste mesmo artigo, commemorando as proezas do av� do condestavel D.
Nuno Alvares, escrevi: _F�ra elle ainda quem acaudilh�ra a hoste de
portuguezes, quando uma invas�o de hespanhoes, em desapoderada fuga,
deixou o sangue de tresentas vidas nas lan�as dos alabardeiros do
arcebispo._ (_Ib._ pag. 92).

Aqui tem s. ex.� a fa�anha que o S� de Miranda celebrou na sua carta a
um dos descendentes do prelado guerreiro; e para que a illustre
escritora a conhe�a de melhor auctoridade que a minha, aqui lhe dou o
traslado de chronista antigo: "Por estes annos, entraram por ordem de
el-rei D. Affonso onzeno de Castella pelo reino de Portugal, com m�o
armada, D. Fernando Rodrigues de Castro e D. Jo�o de Castro seu irm�o,
capit�es do reino de Galliza, roubando, desbaratando quanto achavam, com
muita gente de armas, at� chegarem � cidade do Porto, e fazendo todo
estrago que podiam sem acharem resistencia, estando juntos nella o bispo
D. Vasco, e D. Gon�alo Pereira, arcebispo de Braga, que antes f�ra De�o
do Porto, e o Mestre de Christo D. Frei Estev�o Gon�alves refizeram
1:400 homens entre infantes e cavallos, com os quaes os contrarios n�o
quizeram cometer peleja; e voltando as costas se foram recolhendo com a
preza que levavam; mas seguindo-lhe os portuguezes o alcance lhe fizeram
largar tudo, e custar a retirada mais do que cuidavam, at� que com morte
de D. Jo�o de Castro e outros muitos soldados se foram recolhendo a
Galliza: foi isto na Era de 1374, anno de Christo 1336..." (D. RODRIGO
DA CUNHA, _Cathalogo dos B. do Porto_, pag. 96, edi�. de 1742).

N�o nos restam, pois, incertezas quanto ao feito de armas encomiado por
S� de Miranda; e de todo em todo, � vista do anno em que falleceu o
arcebispo, irrefutavelmente fixado pela sr.� D. Carolina Micha�lis, �
excluido aquelle prelado da interven��o que os historiadores e at�
modernos dramaturgos lhe d�o nos successos posteriores � morte de Ignez
de Castro.

Mas, donde procede essa confus�o dos historiadores? Quem � o sacerdote
Pereira que defendeu o Porto da invas�o do infante D. Pedro em 1355?
Vamos conhecel-o.

Assim como leu a pag. 285 do _Nobiliario do Conde D. Pedro_, se a sr.�
D. Carolina de Vasconcellos lesse a pag. 286, achava a decifra��o do
enigma. Ahi nos conta o continuador do conde de Barcellos (digo
_continuador_, porque D. Pedro fallecido em 1354, n�o podia referir
factos occorridos em 1355) que o defensor da _Villa do Porto_, n�o
fortificada, foi D. Alvaro Gon�alves Pereira, filho do arcebispo D.
Gon�alo. N�o foi portanto, o pai; foi seu filho, o prior do Crato, pai
do condestavel D. Nuno. E por que o texto do _Nobiliario_ tem uma
concis�o engra�ada e pittoresca n�o ser� desagradavel ao leitor
conhecel-o. Vai textualmente: _Este Prior D. Alvaro foi o que pos os
pend�es por muro, estando na villa do Porto para a guardar por mandado
del-rei D. Affonso IV, porque o Infante D. Pedro andava al�ado del,
queimando e destruindo muitos logares do Reino, fazendo mal e danando a
Diogo Lopes Pacheco, a D. Gil Vasques de Rezende e a Pero Coelho e a
todos os que el culpava que foram conselheiros na morte da infanta D.
Ignez de Castro, que citei seu padre matou, e a villa do Porto n�o era
murada em aquelle tempo, sen�o em poucos logares de m�o muro, e o Prior
D. Alvaro fez muros de pend�es das n�os que ahi estavam, chantando as
hastes delles pelo campo a redor da villa, e percebendo_ (industriando)
_suas gentes como defendessem os pendoens. O Infante D. Pedro esteve ahi
em cerca da villa 16 dias com grande poder de fidalgos portuguezes e de
Galiza. Estes fidalgos desejavam muito cobrar a villa por a riqueza
della. Isto durou at� que chegou El-Rei D. Affonso IV, e o Prior D.
Alvaro entregou-lhe sua villa, e alguns disseram que o Infante se
soffreu de combater a villa por honra do Prior D. Alvaro. A verdade
assim pareceu, que o Prior D. Alvaro, como entregou a villa a seu senhor
El-Rei come�ou de andar em preitezias_ (negocia��es) _entre El-Rei seu
padre e aveo-os_ (aven�ou-os) _e fez-lhe dar a sua quantia de maravedis
que seu padre lhe tinha al�ada_ (suspensa) _e fez-lhe dar o condado ao
Infante D. Jo�o seu filho, e outras muitas merc�s... etc._

Ahi est� o facto historico. A correc��o reconstituinte da sr.� D.
Carolina de Vasconcellos e os esclarecimentos que ouso offerecer-lhe
ser�o bastantes para expungir das historias patrias que por ahi correm a
interven��o lendaria do arcebispo de Braga na guerra civil de 1355?
Talvez n�o. Ha erros enkistados que nenhum bisturi de critica desarreiga.

      *      *      *      *      *

Recopilando as impress�es que recebi do livro da illustrada alleman: a
biographia de S� de Miranda, expurgada de inveterados erros, est�
primorosamente redigida. A minudenciosa visita de s. ex.� ao Castro e �
quinta da Tapada revellam o amor com que a auctora estava possuida do
seu assumpto. As reflex�es philologicas rescendem um sabor germanico de
que em Portugal decerto n�o achou exemplos. A linguagem, a despeito de
quasi imperceptiveis incorrec��es, parece ter sido estudada nos melhores
mestres desde os primeiros alvores da sua educa��o literaria. Desata
problemas invencilhados de genealogias; restitue a uns poetas obras
attribuidas a outros; gradua o quilate dos diamantes que lapida sob o
esmeril da critica mais esclarecida. Cotteja factos contemporaneos dos
poemas, para lhes averiguar a ideia ou a allegoria. Prodigiosa paciencia
e rara voca��o por tanta maneira divergente da nossa indole superficial
em averigua��es desta natureza!

Devemos, portanto, � insigne escritora a primeira edi��o digna do grande
e quasi olvidado poeta. Devemos-lhe al�m disso ter feito mais conhecido
e apreciado do que era em Allemanha o grande luminar donde promanaram
discipulos como Antonio Ferreira, Diogo Bernardes, Andrade Caminha, e a
pleiade de seiscentistas que formam com Luiz de Cam�es a idade aurea da
literatura portugueza.

Com o livro estimavel da illustrada escritora ser� mais lido em Portugal
S� de Miranda? Envergonho-me de confessar que n�o. S. ex.� achou-me
exaggerado quando eu disse, que na minha terra se conhecia o poeta _S�_
pelas charadas. "Sou poeta portuguez-I. Poeta portuguez com uma syllaba?
� por for�a S�."

Insisto em teimar, minha senhora, que, quando a transcendente idiotia
das charadas cahir no abysmo do ridiculo, apagar-se-ha de todo o nome do
poeta. E, quando isso succeder, folgar� grandemente a alma rancorosa de
Christov�o do Valle, ex-alcaide de Lindoso, que est�, pelo menos, no
purgatorio expiando a persegui��o que fez ao innocente gallego, vingado
pela satyra do seu immortal patr�o uzurariamente.

S. Miguel de Seide, 1887.

                                              VISCONDE DE CORREIA BOTELHO.




BIBLIOGRAPHIA CAMILLIANA

(CARTA AO AUCTOR)


                                            _Meu prezado Henrique Marques_:

Revia eu as ultimas provas de um modesto livrinho de homenagem, por mim
offerecido � insigne escriptora e minha excellente amiga D. Carolina
Micha�lis de Vasconcellos, quando me chegou �s m�os o precioso exemplar
do monumento, que a perseveran�a de V. soube alevantar � memoria de
Camillo. Compunha-se o meu preito, � alta intelligencia e ao nobre
caracter da senhora D. Carolina Micha�lis, da reuni�o dos artigos, que
em Portugal saudaram a portentosa edi��o das _Obras de S� de Miranda_,
na ordem chronologica do seu apparecimento: s�o dois apenas, que mais
n�o conhe�o, mas com serem dois, teem a impol-os respectivamente a
auctoridade de Anthero de Quental e do Visconde de Correia Botelho, no
unico logar em que Camillo rubricou, com o seu nome transformado, um
escrito literario. � ver o folhetim do n.� 91 do _Commercio do Porto_ de
13 de abril de 1887. Ali, Camillo presta voto de homenagem ao saber e �
honestidade, com que S� de Miranda foi evocado, em um espirito critico a
que andavamos deshabituados, e a que por egual fizeram justi�a, nas
cita��es dos seus livros, Theophilo Braga, Adolpho Coelho, Oliveira
Martins, etc.

Neste lan�o, e uma vez em meu poder a _Bibliographia Camilliana_,
rebusquei a individua��o do estudo de Camillo, que bem interessante �,
por signal. O n.� 573 do seu livro n�o o menciona, nem indica, donde me
pareceu que lhe � desconhecido na f�rma primeira de folhetim; que, de
resto, V. l� o aponta ao memorar dos trechos componentes do _Obulo �s
crean�as_. Junte-o, pois, agora, em f�rma autonoma, � sua esplendida
Camilliana--por certo a mais notavel que ainda se reuniu em Portugal e
no Brazil--e consinta que neste lugar, que j� agora tenho pelo mais
opportuno, e numa cavaqueira amiga, o mais obscuro admirador da sua
monographia, carreie duas ou tres annota��es, que sirvam de
aperfei�oamento � tra�a de um edificio, nobremente cimentado por
trabalho improbo, como � o seu. Acaso vale a pena de consignal-as neste
opusculo, � sombra do nome illustre da doutissima escritora alleman, que
tirou carta de naturalisa��o entre os mais consideraveis publicistas do
nosso paiz, e sob a �gide dos dois grandes homens que firmam as paginas,
precedentes a estas linhas corridas, de palestra amiga.

� de mais rapida mon��o ir inscrevendo as notas em rela��o a numeros, e
na ordem de sec��es. Para aqui as traslado, pois, redigindo os
hierogliphicos, com que marginei o seu presente de nababo, numas horas
rapidas de exame:

N.� 10.--_O Clero e o sr. Alexandre Herculano._--D�ste curioso folheto
extrahiram-se exemplares em papel azul, meio cart�o. Vi ha annos um, na
loja do sr. Jo�o V. da Silva Coelho, � rua Augusta. Vem a p�llo referir
que Latino Coelho inseriu anonimamente, num dos primeiros volumes da
Revista Popular, uns valiosos tra�os de aprecia��o d�ste opusculo.

N.� 95.--_Divindade de Jesus._ Este livro reune artigos publicados
muitos annos antes, e teve como fim immediato facilitar ao auctor a
acquisi��o de um exemplar rarissimo dos _Amusements p�riodiques_ do
Cavalleiro de Oliveyra, que Jos� Gomes Monteiro possuia e que Camillo
namorava desde muito. Esse exemplar ajudou � elabora��o do _Judeu_, da
_Caveira da Martyr_, das _Noites de Insomnia_, e, mais tarde, de algumas
sec��es da _Historia de Portugal_ de Oliveira Martins. Possuo-o eu
actualmente, tendo successivamente pertencido a Augusto Soromenho, Jos�
Gomes, Camillo e Annibal Fernandes Thomaz. Numa das guardas do 1.� vol.,
lan�ou Camillo a seguinte cota: "Dei por este livro o mss. da Divindade
de Jesus, reputado em 14 libras, a Jos� Gomes Monteiro".

N.� 146.--_O Condemnado._--�, effectivamente, uma contrafac��o. Basta
que o meu presado Henrique Marques se d� ao incommodo de reflectir que
em 1871 a casa Mor� se achava ainda num periodo de relativa actividade e
que nada tinha que ver com a loja de Jo�o Coutinho. Pelo mesmo motivo,
applico esta observa��o ao numero immediato, (147).

N.� 174.--_A Caveira da Martyr._--Da queima do 1.� volume--feita por
motivos de consciencia,--salvaram-se uns quarenta exemplares, por se
acharem deslocados nos depositos do editor. S�o esses os que teem sido
vendidos. N�o ha, nem houve reimpress�o daquelle tomo. O editor recusou
mesmo vender a propriedade da obra, quando traspassou a Pedro Correia a
de todas as demais livros de Camillo, que havia adquirido. A nota de H.
Marques � absolutamente injusta. Conhe�o o sr. Tavares Cardoso, o
bastante para tomar a responsabilidade desta affirmativa, que o seu
caracter me garante e abona.

N.� 176.--_Curso de litteratura._--Numa das cartas publicadas no
opusculo adiante descrito, sob n.� 289, acha-se, a breve trecho, uma
curiosa e incisiva aprecia��o da parte d�ste trabalho, redigida por
Andrade Ferreira.

N.� 221.--_Bohemia do Espirito._--O estudo sobre Luis de Cam�es tem,
pelo menos, uma passagem, que se n�o l� nas impress�es anteriores, e que
se refere ao S� de Miranda da sr.� D. Carolina Micha�lis.

N.� 237.--_Delictos da mocidade._--Al�m da edi��o especial que ficou
apontada, ha uma outra, em papel Jap�o tambem, mas sem as letras
capitaes a c�res. Possue um exemplar o meu amigo dr. A. A. de Carvalho
Monteiro.

N.� 263.--_Am�r de perdi��o._--Fui eu quem tra�ou o plano da edi��o.
Pertence-me a reda��o do prospecto e a escolha dos individuos que
tiveram de escrever a parte critica. Camillo tinha em grande atten��o o
meu enthusiasmo por este admiravel livro, a que todavia antepunha o
_Romance de um homem rico_ e o _Retrato de Ricardina_. Dois ou tres dias
depois de uma das muitas conversas que tivemos, sobre o th�ma do _Am�r
de Perdi��o_, vinha-me da residencia amiga de S. Miguel de Seide um
exemplar da extraordinaria novella, com o seguinte _envoi_ do notavel
romancista:--"_Para fazer chorar de novo Joaquim de Araujo--essa suprema
express�o das almas boas, chorar._ C. C. Branco". Henrique Marques cita
um exemplar especial da 1.� edi��o. P�de addicionar-lhe o que deve
existir na Biblioteca particular de El-rei, o que foi presenteado a
Fontes e o que recentemente adquiriu o meu amigo Joaquim Gomes de
Macedo. Esta tiragem especial foi de 12 exemplares, com destino a
brindes, que por ent�o se effectuaram a individuos e sociedades de
Portugal e do Brazil, sob indicativa de Camillo e de Jos� Gomes Monteiro.

N.� 289.--_Cartas de Camillo Castello Branco a Joaquim de Araujo._ Entre
os meus papeis, encontro mais a seguinte missiva de Camillo, bastante
curiosa para a historia do n.� 189:

                                                             _Meu amigo:_

A tarefa de escrever o _Perfil do Marquez de P._ em 20 dias deixou-me o
cerebro em lama. Vou ver se os ares de Braga e a ausencia de livros me
restauram.

Anna Placido vae ler os seus versos. Conhece os que appareceram
dispersos nas folhas. Diz ella que a linguagem dos poetas lhe est� sendo
hoje um dialecto oriental. Accrescenta que est� muito velha, muito
materialisada pela vida rural e pelas enormes tristezas da sua vida.
Entretanto, as suas poesias alumiam escuridoens.

Logo que volte de Braga participo-lh'o.

                                                        De V. Ex.�

                                                    Admirador e amigo

S. C. 2 de junho de 1882.

                                                     _C. Castello Branco._

Nunca vi exemplares em _grand papier_ do _Perfil do Marquez de Pombal_,
mas o editor Manuel Malheiro asseverou-me que fizera imprimir uns tres
ou quatro. S� a sr.� viscondessa de Correia Botelho, minha muito
estimada e querida amiga, poder� desenvincilhar hoje este pequeno
problema bibliographico.

N.� 291--_Genio do Christianismo_--Embora o frontispicio das quatro
edi��es publicadas atribua esta vers�o a Camillo Castello Branco, o
facto � que a interferencia do grande escritor s� tem rela��o com os
primeiros capitulos; os demais foram vertidos por Augusto Soromenho.
Para compensar o editor Coutinho, Camillo derivou o cumprimento do seu
contracto para um romance original--_Como Deus castiga!_ cuja ac��o se
desenrolava pelos tumultos, a que no Porto deu origem a crea��o da
Companhia das Vinhas do Alto Douro. Existem escritos cinco capitulos, um
dos quaes se acha menos correctamente mencionado, sob n.� 607 da
_Bibliographia_. A elabora��o d�ste romance data de 1861; abandonando o
assumpto, Camillo saldou noutro volume as suas contas com o editor.
_Como Deus castiga!_ deve ser citado entre os n.os 49 e 55, no grupo de
obras originaes.

N.� 300--_A Freira no subterraneo._--Nenhuma das edi��es traz nome de
autor; ouvi que Camillo redigira elle proprio o romance, aproveitando
alguns dados de promenorisadas noticias, alludentes ao sequestro de uma
emparedada em um convento russo.

N.os 333 e 373--_Catalogos etc._--A serem verdadeiras, como s�o, para
mim, as indica��es de Henrique Marques, o logar d�stes numeros deve
marcar-se entre a serie das obras originaes do autor.

N.� 470--_Obulo �s crean�as_--As duas prociss�es, dos _Mortos e dos
moribundos_, correram mundo em jornaes diversos, que n�o vejo designados
no 5.� grupo da _Bibliographia_. A proposito, escreveu Camillo a Bulh�o
Pato uma eloquente carta, que este distinctissimo poeta engastou num
commovido folhetim do _Diario Popular_, referente � loucura de Freitas e
Oliveira. Camillo convidava Bulh�o Pato a enfileirar tambem
processionalmente os seus mortos queridos. Com um talento extraordinario
de vis�o das idades transcorridas, com o inestimavel estilo que Oliveira
Martins considerava impressionavelmente consolador e unico, nessas
evoca��es, j�, antes do convite de Camillo, Bulh�o Pato fundira o
inimitavel tomo _Sob os Ciprestes_. Pelo corrente deste livro, as suas
recentes _Memorias_ pertencem � cathegoria dos trabalhos de primeira
ordem, que, entre n�s, se teem produzido, na segunda metade deste
seculo. Admiro sem restri��es o autor de t�o altos primores, como os que
se revelam nas nobres paginas consagradas a Anthero de Quental.

Entre os livros que conteem escritos de Camillo, por certo que ainda
falta--e at� quando?--accentuar bastantes, embora V. apresente uma
soberba lista; lembra-me indicar-lhe a _A Propriedade intellectual_ do
meu querido amigo e eminente publicista Visconde de Faria Maya, impresso
num limitadissimo numero de exemplares, em Ponta Delgada; os _Homens e
letras_ de Candido de Figueiredo; _A Sciencia e probidade_ de Francisco
Adolpho Coelho; o _Fausto de Castilho julgado pelo elogio mutuo_ de
Joaquim de Vasconcellos; e um dos _Catalogos_ do sr. Lima Calheiros:
sendo possivel que neste capitulo se possam inscrever os trabalhos
philologicos de Manuel de Mello e os opusculos faustianos de Gra�a
Barreto. Escrevendo estas linhas longe dos meus livros, n�o posso jurar
nas ultimas indica��es, que registro, apenas, a beneficio de inventario.

Quanto � sec��o de jornaes e revistas, ha que ter em conta os numeros do
_Primeiro de Janeiro_, em que Camillo publicou a _Necrologia do
commendador Vieira de Castro_, as cartas a Germano de Meyrelles por
motivo do processo do grande tribuno d�ste nome, e a Jo�o de Oliveira
Ramos, em occasi�es varias; o _Circulo Camoniano_; o _Diario da Tarde_,
onde a collabora��o de Camillo foi extensa, e onde se acha reproduzida a
materia do _Bico de gaz_ (n.� 504), sem a menor obediencia �s sete
chaves com que, annos depois (!), na Bibliotheca Municipal do Porto
intelligentemente lhe vedaram, a V., o direito de copiar o exemplar, que
l� se guarda; o _Diario Nacional_ que revelou em primeira m�o alguns dos
promenores historicos de _D. Luis de Portugal_. Muitos outros haver�
decerto. E por se fallar em jornaes, lembro-lhe a utilidade de nos
indices finaes do seu trabalho, mencionar � parte os periodicos, de
qualquer indole, que tiveram Camillo como redactor ou editor exclusivo,
e bem assim os volumes que devem a sua impress�o ou reedi��o ao grande
escritor, embora com o concurso de livreiros. Dada a lucidissima
organisa��o dos seus numeros de recorrencia, � facil esmiu�ar toda a
casta de indices. Um dos mais curiosos seria o de todas as pessoas
citadas na _Bibliographia Camilliana_.

Uma observa��o ainda: diz respeito a tiragens especiaes. Ha, que eu
saiba, dos seguintes numeros: 368 (poucos exemplares em papel Whatman);
401 (oitenta a cem exemplares em velino e linho nacional); 409 (1
exemplar em China, 2 em velino, e 38 em linho) 458 (6 exemplares em
Whatman); 462 (diversos exemplares em linho); 488 (8 exemplares em
China); 494 (6 exemplares em papel cart�o amarello.) Das _Poesias e
prosas de Soropita_ fez-se tambem uma impress�o � parte, de pouquissimos
exemplares, menos talvez ainda do que os que o editor Chardron mandou
tirar das _Escava��es bibliographicas_, folhetim do _Diario Mercantil_,
em que Theophilo Braga analisou severamente o apparecimerito daquelle
volume.

Clareia a manhan, e tempo � de ensaiar um termo a esta carta, do tamanho
classico das legoas da Povoa. Infelizmente, n�o lhe posso dar mais alta
prova da minha considera��o pelo seu livro, digno, em tudo, do grande
escritor a quem � consagrado, e quasi pagamento de uma divida nacional.
Por mim, registro-o como um dos mais valiosos subsidios para a nossa
moderna historia literaria, e as pequenas minucias que lhe addito
testemunham exhuberantemente ao meu amigo o applauso mais sincero e o
parabem mais enthusiastico. Do seu editor, e meu excellente amigo A. M.
Pereira, t�o s�mente lhe digo que, na publica��o da _Bibliographia
Camilliana_, praticou uma das mais bellas ac��es da sua brilhantissima
carreira.

S. c. Lisboa, 25 de agosto, 94.

                                              Seu adm.or e amigo obg.mo

                                                     _Joaquim de Araujo._




Pre�o 200 r�is





End of the Project Gutenberg EBook of S� de Miranda, by 
Antero Tarqu�nio de Quental and Camilo Ferreira Botelho Castelo Branco and Joaquim de Araujo

*** END OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK S� DE MIRANDA ***

***** This file should be named 25845-8.txt or 25845-8.zip *****
This and all associated files of various formats will be found in:
        https://www.gutenberg.org/2/5/8/4/25845/

Produced by Pedro Saborano (produced from scanned images
of public domain material from Google Book Search)


Updated editions will replace the previous one--the old editions
will be renamed.

Creating the works from public domain print editions means that no
one owns a United States copyright in these works, so the Foundation
(and you!) can copy and distribute it in the United States without
permission and without paying copyright royalties.  Special rules,
set forth in the General Terms of Use part of this license, apply to
copying and distributing Project Gutenberg-tm electronic works to
protect the PROJECT GUTENBERG-tm concept and trademark.  Project
Gutenberg is a registered trademark, and may not be used if you
charge for the eBooks, unless you receive specific permission.  If you
do not charge anything for copies of this eBook, complying with the
rules is very easy.  You may use this eBook for nearly any purpose
such as creation of derivative works, reports, performances and
research.  They may be modified and printed and given away--you may do
practically ANYTHING with public domain eBooks.  Redistribution is
subject to the trademark license, especially commercial
redistribution.



*** START: FULL LICENSE ***

THE FULL PROJECT GUTENBERG LICENSE
PLEASE READ THIS BEFORE YOU DISTRIBUTE OR USE THIS WORK

To protect the Project Gutenberg-tm mission of promoting the free
distribution of electronic works, by using or distributing this work
(or any other work associated in any way with the phrase "Project
Gutenberg"), you agree to comply with all the terms of the Full Project
Gutenberg-tm License (available with this file or online at
https://gutenberg.org/license).


Section 1.  General Terms of Use and Redistributing Project Gutenberg-tm
electronic works

1.A.  By reading or using any part of this Project Gutenberg-tm
electronic work, you indicate that you have read, understand, agree to
and accept all the terms of this license and intellectual property
(trademark/copyright) agreement.  If you do not agree to abide by all
the terms of this agreement, you must cease using and return or destroy
all copies of Project Gutenberg-tm electronic works in your possession.
If you paid a fee for obtaining a copy of or access to a Project
Gutenberg-tm electronic work and you do not agree to be bound by the
terms of this agreement, you may obtain a refund from the person or
entity to whom you paid the fee as set forth in paragraph 1.E.8.

1.B.  "Project Gutenberg" is a registered trademark.  It may only be
used on or associated in any way with an electronic work by people who
agree to be bound by the terms of this agreement.  There are a few
things that you can do with most Project Gutenberg-tm electronic works
even without complying with the full terms of this agreement.  See
paragraph 1.C below.  There are a lot of things you can do with Project
Gutenberg-tm electronic works if you follow the terms of this agreement
and help preserve free future access to Project Gutenberg-tm electronic
works.  See paragraph 1.E below.

1.C.  The Project Gutenberg Literary Archive Foundation ("the Foundation"
or PGLAF), owns a compilation copyright in the collection of Project
Gutenberg-tm electronic works.  Nearly all the individual works in the
collection are in the public domain in the United States.  If an
individual work is in the public domain in the United States and you are
located in the United States, we do not claim a right to prevent you from
copying, distributing, performing, displaying or creating derivative
works based on the work as long as all references to Project Gutenberg
are removed.  Of course, we hope that you will support the Project
Gutenberg-tm mission of promoting free access to electronic works by
freely sharing Project Gutenberg-tm works in compliance with the terms of
this agreement for keeping the Project Gutenberg-tm name associated with
the work.  You can easily comply with the terms of this agreement by
keeping this work in the same format with its attached full Project
Gutenberg-tm License when you share it without charge with others.

1.D.  The copyright laws of the place where you are located also govern
what you can do with this work.  Copyright laws in most countries are in
a constant state of change.  If you are outside the United States, check
the laws of your country in addition to the terms of this agreement
before downloading, copying, displaying, performing, distributing or
creating derivative works based on this work or any other Project
Gutenberg-tm work.  The Foundation makes no representations concerning
the copyright status of any work in any country outside the United
States.

1.E.  Unless you have removed all references to Project Gutenberg:

1.E.1.  The following sentence, with active links to, or other immediate
access to, the full Project Gutenberg-tm License must appear prominently
whenever any copy of a Project Gutenberg-tm work (any work on which the
phrase "Project Gutenberg" appears, or with which the phrase "Project
Gutenberg" is associated) is accessed, displayed, performed, viewed,
copied or distributed:

This eBook is for the use of anyone anywhere at no cost and with
almost no restrictions whatsoever.  You may copy it, give it away or
re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included
with this eBook or online at www.gutenberg.org

1.E.2.  If an individual Project Gutenberg-tm electronic work is derived
from the public domain (does not contain a notice indicating that it is
posted with permission of the copyright holder), the work can be copied
and distributed to anyone in the United States without paying any fees
or charges.  If you are redistributing or providing access to a work
with the phrase "Project Gutenberg" associated with or appearing on the
work, you must comply either with the requirements of paragraphs 1.E.1
through 1.E.7 or obtain permission for the use of the work and the
Project Gutenberg-tm trademark as set forth in paragraphs 1.E.8 or
1.E.9.

1.E.3.  If an individual Project Gutenberg-tm electronic work is posted
with the permission of the copyright holder, your use and distribution
must comply with both paragraphs 1.E.1 through 1.E.7 and any additional
terms imposed by the copyright holder.  Additional terms will be linked
to the Project Gutenberg-tm License for all works posted with the
permission of the copyright holder found at the beginning of this work.

1.E.4.  Do not unlink or detach or remove the full Project Gutenberg-tm
License terms from this work, or any files containing a part of this
work or any other work associated with Project Gutenberg-tm.

1.E.5.  Do not copy, display, perform, distribute or redistribute this
electronic work, or any part of this electronic work, without
prominently displaying the sentence set forth in paragraph 1.E.1 with
active links or immediate access to the full terms of the Project
Gutenberg-tm License.

1.E.6.  You may convert to and distribute this work in any binary,
compressed, marked up, nonproprietary or proprietary form, including any
word processing or hypertext form.  However, if you provide access to or
distribute copies of a Project Gutenberg-tm work in a format other than
"Plain Vanilla ASCII" or other format used in the official version
posted on the official Project Gutenberg-tm web site (www.gutenberg.org),
you must, at no additional cost, fee or expense to the user, provide a
copy, a means of exporting a copy, or a means of obtaining a copy upon
request, of the work in its original "Plain Vanilla ASCII" or other
form.  Any alternate format must include the full Project Gutenberg-tm
License as specified in paragraph 1.E.1.

1.E.7.  Do not charge a fee for access to, viewing, displaying,
performing, copying or distributing any Project Gutenberg-tm works
unless you comply with paragraph 1.E.8 or 1.E.9.

1.E.8.  You may charge a reasonable fee for copies of or providing
access to or distributing Project Gutenberg-tm electronic works provided
that

- You pay a royalty fee of 20% of the gross profits you derive from
     the use of Project Gutenberg-tm works calculated using the method
     you already use to calculate your applicable taxes.  The fee is
     owed to the owner of the Project Gutenberg-tm trademark, but he
     has agreed to donate royalties under this paragraph to the
     Project Gutenberg Literary Archive Foundation.  Royalty payments
     must be paid within 60 days following each date on which you
     prepare (or are legally required to prepare) your periodic tax
     returns.  Royalty payments should be clearly marked as such and
     sent to the Project Gutenberg Literary Archive Foundation at the
     address specified in Section 4, "Information about donations to
     the Project Gutenberg Literary Archive Foundation."

- You provide a full refund of any money paid by a user who notifies
     you in writing (or by e-mail) within 30 days of receipt that s/he
     does not agree to the terms of the full Project Gutenberg-tm
     License.  You must require such a user to return or
     destroy all copies of the works possessed in a physical medium
     and discontinue all use of and all access to other copies of
     Project Gutenberg-tm works.

- You provide, in accordance with paragraph 1.F.3, a full refund of any
     money paid for a work or a replacement copy, if a defect in the
     electronic work is discovered and reported to you within 90 days
     of receipt of the work.

- You comply with all other terms of this agreement for free
     distribution of Project Gutenberg-tm works.

1.E.9.  If you wish to charge a fee or distribute a Project Gutenberg-tm
electronic work or group of works on different terms than are set
forth in this agreement, you must obtain permission in writing from
both the Project Gutenberg Literary Archive Foundation and Michael
Hart, the owner of the Project Gutenberg-tm trademark.  Contact the
Foundation as set forth in Section 3 below.

1.F.

1.F.1.  Project Gutenberg volunteers and employees expend considerable
effort to identify, do copyright research on, transcribe and proofread
public domain works in creating the Project Gutenberg-tm
collection.  Despite these efforts, Project Gutenberg-tm electronic
works, and the medium on which they may be stored, may contain
"Defects," such as, but not limited to, incomplete, inaccurate or
corrupt data, transcription errors, a copyright or other intellectual
property infringement, a defective or damaged disk or other medium, a
computer virus, or computer codes that damage or cannot be read by
your equipment.

1.F.2.  LIMITED WARRANTY, DISCLAIMER OF DAMAGES - Except for the "Right
of Replacement or Refund" described in paragraph 1.F.3, the Project
Gutenberg Literary Archive Foundation, the owner of the Project
Gutenberg-tm trademark, and any other party distributing a Project
Gutenberg-tm electronic work under this agreement, disclaim all
liability to you for damages, costs and expenses, including legal
fees.  YOU AGREE THAT YOU HAVE NO REMEDIES FOR NEGLIGENCE, STRICT
LIABILITY, BREACH OF WARRANTY OR BREACH OF CONTRACT EXCEPT THOSE
PROVIDED IN PARAGRAPH F3.  YOU AGREE THAT THE FOUNDATION, THE
TRADEMARK OWNER, AND ANY DISTRIBUTOR UNDER THIS AGREEMENT WILL NOT BE
LIABLE TO YOU FOR ACTUAL, DIRECT, INDIRECT, CONSEQUENTIAL, PUNITIVE OR
INCIDENTAL DAMAGES EVEN IF YOU GIVE NOTICE OF THE POSSIBILITY OF SUCH
DAMAGE.

1.F.3.  LIMITED RIGHT OF REPLACEMENT OR REFUND - If you discover a
defect in this electronic work within 90 days of receiving it, you can
receive a refund of the money (if any) you paid for it by sending a
written explanation to the person you received the work from.  If you
received the work on a physical medium, you must return the medium with
your written explanation.  The person or entity that provided you with
the defective work may elect to provide a replacement copy in lieu of a
refund.  If you received the work electronically, the person or entity
providing it to you may choose to give you a second opportunity to
receive the work electronically in lieu of a refund.  If the second copy
is also defective, you may demand a refund in writing without further
opportunities to fix the problem.

1.F.4.  Except for the limited right of replacement or refund set forth
in paragraph 1.F.3, this work is provided to you 'AS-IS' WITH NO OTHER
WARRANTIES OF ANY KIND, EXPRESS OR IMPLIED, INCLUDING BUT NOT LIMITED TO
WARRANTIES OF MERCHANTIBILITY OR FITNESS FOR ANY PURPOSE.

1.F.5.  Some states do not allow disclaimers of certain implied
warranties or the exclusion or limitation of certain types of damages.
If any disclaimer or limitation set forth in this agreement violates the
law of the state applicable to this agreement, the agreement shall be
interpreted to make the maximum disclaimer or limitation permitted by
the applicable state law.  The invalidity or unenforceability of any
provision of this agreement shall not void the remaining provisions.

1.F.6.  INDEMNITY - You agree to indemnify and hold the Foundation, the
trademark owner, any agent or employee of the Foundation, anyone
providing copies of Project Gutenberg-tm electronic works in accordance
with this agreement, and any volunteers associated with the production,
promotion and distribution of Project Gutenberg-tm electronic works,
harmless from all liability, costs and expenses, including legal fees,
that arise directly or indirectly from any of the following which you do
or cause to occur: (a) distribution of this or any Project Gutenberg-tm
work, (b) alteration, modification, or additions or deletions to any
Project Gutenberg-tm work, and (c) any Defect you cause.


Section  2.  Information about the Mission of Project Gutenberg-tm

Project Gutenberg-tm is synonymous with the free distribution of
electronic works in formats readable by the widest variety of computers
including obsolete, old, middle-aged and new computers.  It exists
because of the efforts of hundreds of volunteers and donations from
people in all walks of life.

Volunteers and financial support to provide volunteers with the
assistance they need, is critical to reaching Project Gutenberg-tm's
goals and ensuring that the Project Gutenberg-tm collection will
remain freely available for generations to come.  In 2001, the Project
Gutenberg Literary Archive Foundation was created to provide a secure
and permanent future for Project Gutenberg-tm and future generations.
To learn more about the Project Gutenberg Literary Archive Foundation
and how your efforts and donations can help, see Sections 3 and 4
and the Foundation web page at https://www.pglaf.org.


Section 3.  Information about the Project Gutenberg Literary Archive
Foundation

The Project Gutenberg Literary Archive Foundation is a non profit
501(c)(3) educational corporation organized under the laws of the
state of Mississippi and granted tax exempt status by the Internal
Revenue Service.  The Foundation's EIN or federal tax identification
number is 64-6221541.  Its 501(c)(3) letter is posted at
https://pglaf.org/fundraising.  Contributions to the Project Gutenberg
Literary Archive Foundation are tax deductible to the full extent
permitted by U.S. federal laws and your state's laws.

The Foundation's principal office is located at 4557 Melan Dr. S.
Fairbanks, AK, 99712., but its volunteers and employees are scattered
throughout numerous locations.  Its business office is located at
809 North 1500 West, Salt Lake City, UT 84116, (801) 596-1887, email
business@pglaf.org.  Email contact links and up to date contact
information can be found at the Foundation's web site and official
page at https://pglaf.org

For additional contact information:
     Dr. Gregory B. Newby
     Chief Executive and Director
     gbnewby@pglaf.org


Section 4.  Information about Donations to the Project Gutenberg
Literary Archive Foundation

Project Gutenberg-tm depends upon and cannot survive without wide
spread public support and donations to carry out its mission of
increasing the number of public domain and licensed works that can be
freely distributed in machine readable form accessible by the widest
array of equipment including outdated equipment.  Many small donations
($1 to $5,000) are particularly important to maintaining tax exempt
status with the IRS.

The Foundation is committed to complying with the laws regulating
charities and charitable donations in all 50 states of the United
States.  Compliance requirements are not uniform and it takes a
considerable effort, much paperwork and many fees to meet and keep up
with these requirements.  We do not solicit donations in locations
where we have not received written confirmation of compliance.  To
SEND DONATIONS or determine the status of compliance for any
particular state visit https://pglaf.org

While we cannot and do not solicit contributions from states where we
have not met the solicitation requirements, we know of no prohibition
against accepting unsolicited donations from donors in such states who
approach us with offers to donate.

International donations are gratefully accepted, but we cannot make
any statements concerning tax treatment of donations received from
outside the United States.  U.S. laws alone swamp our small staff.

Please check the Project Gutenberg Web pages for current donation
methods and addresses.  Donations are accepted in a number of other
ways including including checks, online payments and credit card
donations.  To donate, please visit: https://pglaf.org/donate


Section 5.  General Information About Project Gutenberg-tm electronic
works.

Professor Michael S. Hart was the originator of the Project Gutenberg-tm
concept of a library of electronic works that could be freely shared
with anyone.  For thirty years, he produced and distributed Project
Gutenberg-tm eBooks with only a loose network of volunteer support.


Project Gutenberg-tm eBooks are often created from several printed
editions, all of which are confirmed as Public Domain in the U.S.
unless a copyright notice is included.  Thus, we do not necessarily
keep eBooks in compliance with any particular paper edition.


Most people start at our Web site which has the main PG search facility:

     https://www.gutenberg.org

This Web site includes information about Project Gutenberg-tm,
including how to make donations to the Project Gutenberg Literary
Archive Foundation, how to help produce our new eBooks, and how to
subscribe to our email newsletter to hear about new eBooks.